TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO – Advocacia Trabalhista Curitiba – Zavadniak & Honorato Advogados Trabalhistas Curitiba AÇÃO CIVIL PÚBLICA
PROCESSO TST-RR Nº 743.929/2001-0
Acórdão – 5ª Turma
EMENTA
Ação civil pública – Contratação fraudulenta – Cooperativas – Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Lei Municipal que implanta Plano de Atendimento à Saúde (PAS) por intermédio de cooperativas (cooperativas internas) a serem constituídas por servidores públicos municipais licenciados para esse fim específico. 1. Posterior contratação, pelas cooperativas internas, de outras cooperativas internas, de outras cooperativas (cooperativas externas), não previstas no plano original, por meio das quais se arregimentavam trabalhadores para efetiva implementação do PAS e a eles impunha-se a condição de "cooperados". 2. Legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho para propositura de Ação Civil Pública na qual se deduz, fundamentalmente, três pedidos: a) abstenção de contratação de mão-de-obra por meio das cooperativas externas; b) declaração de inidoneidade dessas cooperativas e; c) reconhecimento do vínculo empregatício entre os pseudocooperados e as cooperativas internas. 3. Defesa de interesses difusos e coletivos. 4. Pedido de reconhecimento de vínculo que não se insere no conceito de interesses difusos ou coletivos. 6. Pedidos de abstenção de contratação de mão-de-obra por meio das cooperativas externas e declaração de inidoneidade dessas cooperativas que dizem com a capacidade postulatória do Ministério Público do Trabalho na defesa de interesses difusos, interesses coletivos e direitos individuais homogêneos, visto que, de comum, possuem a possibilidade de serem tutelados na modalidade coletiva, por intermédio de ação do Ministério Público do Trabalho. Assim é, porque os primeiros e os segundos podem, ocasionalmente, englobar os terceiros. 7. Trata-se de interesses difusos na medida em que o Município, a permanecer com a prática de contratação de empregados por intermédio das chamadas "cooperativas externas", estará se servindo de mão-de-obra contratada sem o obrigatório concurso público, tolhendo o direito de toda uma coletividade de se habilitar para o ingresso no serviço público, nos moldes em que prescreve o art. 37, inciso II, da Constituição da República. 8. São interesses coletivos quando, havendo intermediação de mão-de-obra pelas cooperativas externas, aos trabalhadores aliciados é imposta a condição de "cooperados", excluindo-os, assim, dos benefícios emergentes do contrato de trabalho. 9. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho que encontra respaldo na competência a ele atribuída pelos artigos 129, inciso III, da Constituição da República e 83, inciso III, e 84, inciso II, da Lei Complementar
nº 75/93. 10. Recurso de revista conhecido e a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista TST-RR nº 743.929/2001.0, em que é recorrente Ministério Público do Trabalho da 2ª Região e recorridos Município de São Paulo, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Superior – Cooperpas Sup 4 e Outros, Cooperadps – Cooperativa dos Profissionais de Saúde, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Coopermed 3 e Outros, Coopermedic de São Paulo – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, Paramédica Sociedade Cooperativa de Trabalho dos Auxiliares de Serviços de Saúde e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Superior – Cooperpas 2, Cooperativa dos Profissionais da Saúde – Cooperplus 2, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Técnico – Cooperpas Tec. 1 e Outros, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Cooperplus 11 e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde – Cooperpas 9 e Outros, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Coopermed 2 e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Superior – Cooperpas 12, Cooperativa dos Profissionais de Saúde de Nível Médio e Superior – Cooperplus 12, Cooperativa Complementar à Saúde – Coopersaúde e Cooperext – Cooperativa de Profissionais de Saúde.
"O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, pelo acórdão de fls. 11.267/11.273 (36º v.), acolheu a preliminar de falta de legitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor a presente Ação Civil Pública e, em conseqüência, julgou extinto o processo, sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, inciso VI, do CPC.
O Regional, examinando a inicial, consignou que o Ministério Público do Trabalho: 1) propôs Ação Civil Pública contra as Cooperativas Externas e Internas do Plano de Atendimento à Saúde (PAS) e o Município de São Paulo, aduzindo que, para o atendimento ao PAS, formaram-se 2 (duas) espécies de cooperativas de trabalho, a primeira, denominada de Cooperativa Interna, formada exclusivamente por funcionários públicos municipais licenciados, que se organizaram na Cooperpas/Tec (formada por profissionais da saúde de nível técnico) e na Cooperpas/Méd (formada por profissionais da saúde da classe médica), e a segunda, denominada de Cooperativa Externa, constituída por trabalhadores não integrantes do quadro de servidores públicos municipais; 2) na mencionada inicial, argumentou que, com base nos fatos averiguados pela Delegacia Regional do Trabalho e pelo próprio Ministério Público do Trabalho, constatou-se que as cooperativas externas foram criadas, especificamente, para funcionar como intermediadoras de mão-de-obra utilizada pelas cooperativas internas, com evidente fraude à lei, uma vez que as reais empregadoras dos trabalhadores, falsamente admitidos como cooperados, são a Cooperpas e a Coopermed; e 3) diante dos fatos acima narrados, pediu a declaração do vínculo empregatício dos trabalhadores admitidos através das falsas cooperativas (cooperativas externas) diretamente com a Cooperpas e a Coopermed a que estivessem vinculados, com o reconhecimento de todas as verbas trabalhistas decorrentes do pacto laboral, e por padecer de vícios tais atos, deve o Município de São Paulo, na qualidade de responsável subsidiário pelos serviços realizados, proibir tal prática.
A egrégia Corte de origem, analisando o disposto nos artigos 129, inciso III, da CF/88; 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; 81, parágrafo único, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); e 1º, inciso IV, da Lei
nº 7.347/85, concluiu pela ilegitimidade do Ministério Público para propor a demanda, pois, na espécie, não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que o acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Acrescentou que, ao se postular a determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam no âmbito dos interesses individuais.
O Ministério Público do Trabalho opôs Embargos de Declaração (fls. 11.277/11.280), postulando os seguintes esclarecimentos: 1) caracterização do pedido de "abstenção, por parte das cooperativas internas, de terceirizar os serviços ilicitamente" na qualificação de direito individual, ou seja, em que medida a extensão da prática lesiva pode ser individualizada, mormente considerando-se a continuidade da prática a atingir a atual coletividade de trabalhadores e aqueles, não identificáveis, que futuramente serão lesados pela ilicitude relatada; 2) análise da caracterização constante do acórdão embargado à luz do artigo 81, § 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90, que conceitua interesses difusos e coletivos; e 3) por qual razão o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício a todos os lesados é circunscrito à esfera meramente individual, à luz do artigo 81, inciso III, da mencionada Lei, no qual consta que interesses individuais homogêneos são aqueles "decorrentes de origem comum".
Em resposta, o egrégio TRT de origem rejeitou-os por entender que a questão relativa à legitimidade do Ministério Público do Trabalho para a propositura da ação foi claramente explicitada e fundamentada no acórdão embargado, pelo que o julgado embargado não padecia dos vícios de obscuridade, dúvida ou contradição (fls. 11.282/11.284).
O Ministério Público do Trabalho interpõe Recurso de Revista às fls. 11.288/11.310, com fulcro no artigo 896, alíneas a e c, da CLT. Argúi, preliminarmente, a nulidade do acórdão do Regional por negativa de prestação jurisdicional, apontando violação dos artigos 93, IX, da CF/88, e 832 da CLT, bem como transcrevendo julgados ao cotejo. Argumenta que o Regional, mesmo com a oposição de Embargos de Declaração, não se manifestou acerca: 1) da caracterização dos pedidos de abstenção de contratar através de cooperativas fraudulentas e de reconhecimento do vínculo empregatício dos pseudo-cooperados ante a fraude à lei perpetrada, à luz do artigo 81, parágrafo único, da Lei
nº 8.078/90, o qual define os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos; e 2) dos fundamentos que justificam a conceituação e definição jurídica dos direitos contidos no pedido como individuais, limitando-se a taxá-los como tal. Quanto à legitimidade do Ministério Público para propor a presente Ação Civil Pública, indica ofensa aos incisos I, II e III, do parágrafo único, do artigo 81 da Lei nº 8.078/90, e apresenta arestos para confronto de teses.
Despacho de admissibilidade à fl. 11.311.
Contra-razões apresentadas, pelo Município de São Paulo (fls. 11.316/11.318); pela Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Cooperpas Méd 4 (fls. 11.320/11.327); pela Cooperativa dos Profissionais de Saúde – Cooperadps (fls. 11.328/11.330); e pela Cooperpas 8 – Cooperativa de Profissionais da Saúde, na qualidade de incorporadora das Cooperativas de Trabalho de Nível Universitário que atuam na área de saúde, Cooperpas 7, Cooperpas 15, Coopermed 8 – Cooperativa dos Profissionais de Nível Médio da Saúde, incorporadora da Coopermed 7 – Cooperativa dos Profissionais de Nível Médio da Saúde, Coopermed 15 – Cooperativa de Trabalho dos Profissionais em Nível Médio, Básico e Operacional que atuam na área de saúde, Coopermed 11 – Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Médio, Cooperart – Cooperativa dos Profissionais Autônomos, Coopasa – Cooperativa de Profissionais de Apoio à Saúde, Coopermult/São Miguel Paulista – Cooperativa de Profissionais da Saúde e Coprol – Cooperativa de Profissionais Liberais de São Paulo (fls. 11.331/11.340).
Os presentes autos deixaram de ser remetidos ao Ministério Público do Trabalho, por se tratar de ação originária em que ele é autor (art. 113, § 1º, inciso I, do RITST)".
É o relatório, conforme aprovado em sessão.
VOTO
Preenchidos os pressupostos genéricos de admissibilidade do Recurso de Revista, passo ao exame dos intrínsecos.
1 – Conhecimento
1.1 – Preliminar de nulidade do Acórdão do Regional. Negativa de prestação jurisdicional.
Em voto da lavra do nobre Ministro Rider Nogueira de Brito, a Quinta Turma não conheceu de nulidade consoante os seguintes fundamentos assim lançados pelo relator originário:
"A egrégia Corte de origem, analisando o disposto nos artigo 129, inciso III, da CF/88; 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; 81, parágrafo único, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); e 1º, inciso IV, da Lei
nº 7.347/85, concluiu pela ilegitimidade do Ministério Público para propor a demanda, pois, na espécie, não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que o acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Acrescentou que, ao se postular a determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudo-cooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam no âmbito dos interesses individuais (fls. 11.270/11.273).
Dessa decisão, o Ministério Público do Trabalho opôs Embargos de Declaração (fls. 11.277/11.280), postulando os seguintes esclarecimentos: 1) caracterização do pedido de "abstenção, por parte das cooperativas internas, de terceirizar os serviços ilicitamente" na qualificação de direito individual, ou seja, em que medida a extensão da prática lesiva pode ser individualizada, mormente considerando-se a continuidade da prática a atingir a atual coletividade de trabalhadores e aqueles, não identificáveis, que futuramente serão lesados pela ilicitude relatada; 2) análise da caracterização constante do acórdão embargado à luz do artigo 81, § 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90, que conceitua interesses difusos e coletivos; e 3) por qual razão o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício a todos os lesados é circunscrito à esfera meramente individual, à luz do artigo 81, inciso III, da mencionada Lei, no qual consta que interesses individuais homogêneos são aqueles "decorrentes de origem comum".
Em resposta, o egrégio TRT de origem rejeitou-os, nos seguintes termos:
"Na composição da lide, por operação dialética, basta ao julgador reunir os pontos relevantes sobre os quais fundamentadamente, se deve pronunciar, não havendo necessidade de se apreciar, ponto por ponto, os argumentos expendidos pelas partes. Assim, o Juízo deve solucionar todas as questões de fato ou de direito que lhe são apresentadas, decidindo-as de forma fundamentada (artigo 93, IX, da Constituição Federal de 1988 e artigo 832 da CLT).
Entretanto, na hipótese em exame, a questão de legitimidade de parte do Parquet para a propositura da presente ação acha-se claramente explicitada e fundamentada no v. Acórdão embargado, inclusive para fins de prequestionamento. Os critérios de qualificação jurídica dos fatos postos em Juízo pelos litigantes, não cabem nos limites dos embargados de declaração.
Como a prestação jurisdicional foi devidamente entregue, não padecendo o v. Acórdão embargado de obscuridade, dúvida ou contradição, não há como se dar provimento aos presentes embargos de declaração, na medida em que não observados os limites do artigo 535 do CPC, que estabelecem o seu cabimento" (fls. 11.283/11.284).
O Ministério Público, em suas razões de revista, sustenta que, mesmo com a oposição de Embargos de Declaração, o Regional não se manifestou acerca: 1) da caracterização dos pedidos de abstenção de contratar através de cooperativas fraudulentas e de reconhecimento do vínculo empregatício dos pseudo-cooperados ante a fraude à lei perpetrada, à luz do artigo 81, parágrafo único, da Lei nº 8.078/90, o qual define os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos; e 2) dos fundamentos que justificam a conceituação e definição jurídica dos direitos contidos no pedido como individuais, limitando-se a taxá-los como tal. Reputa ofendidos os artigos 93, IX, da CF/88, e 832 da CLT, bem como transcreve julgados ao cotejo.
Quanto a este tema, o Recurso não merece prosperar.
Com efeito, a egrégia Corte Regional, apreciando as razões apresentadas, tanto no Recurso ordinário como nos Embargos Declaratórios, emitiu detalhadamente toda a fundamentação necessária, ao acolher a preliminar de ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor a ação cível pública, notadamente, a respeito do enquadramento do pedido constante na inicial e definição jurídica destes como individuais às fls. 11.271 (segundo ao último parágrafo), 11.272 (primeiro parágrafo), e 11.273 (terceiro e quarto parágrafos), conforme se pode verificar do trecho a seguir transcrito:
"(...)
A questão que se indaga é se os pedidos da presente ação estão contidos nos limites em que legitimado o Ministério Público do Trabalho para agir.
Reza o artigo 129 da Constituição Federal de 1988:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(...)
III – promover o inquérito civil e ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
A Lei Orgânica do Ministério Público reserva ao Ministério Público do Trabalho a legitimação para a propositura da ação civil pública, sendo que atuação do Órgão deve ocorrer nesta Justiça Trabalhista.
Atente-se para o artigo 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, que assim dispõe:
Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:
(...)
III – Promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para a defesa dos interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionais garantidos.
A ação civil pública, instituto regido pela Lei nº 7.347/85, teve seus limites ampliados pelo Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, que adicionou o inciso IV ao artigo 1º da Lei nº 7.347/85, no qual se coloca sob a égide da ação civil pública ‘qualquer outro interesse difuso ou coletivo’.
Por outro lado, a definição de interesses difusos e coletivos se encontra também no Código de Defesa do Consumidor, e se dá nos seguintes termos:
Art. 81. (...)
Parágrafo único
(...)
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeito deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
(...)
Tecidas essas considerações, a própria inicial revela que com a presente ação não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que a acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Ao se postular que se determine que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e que as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam ao âmbito dos interesses individuais.
De tudo isso se conclui, data venia do entendimento da d. Vara de origem, que na hipótese em exame os direitos pleiteados não são direitos coletivos de molde a atribuir legitimidade ao Ministério Público para promover a defesa dos seus interesses, mas reconhecimento de direitos que individualmente podem ser perseguidos.
Tem-se, in casu, discussão sobre direitos individuais, fora do âmbito ‘individuais homogêneos’ pelo que haveria de ser decretada ab initio a ilegitimidade da recorrente" (fls. 11.271/11.273).
Como se vê, a prestação jurisdicional foi plenamente entregue, embora de forma diversa da pretendida.
Assim, incólumes os artigos 93, inciso IX, da CF/88, e 832 da CLT. Saliente-se, ainda, ser despicienda a análise da alegada divergência jurisprudencial (fls. 315/316), diante do que consagra a OJ
nº 115 da SBDI-1 desta Corte.
Não conheço da preliminar.
1.2. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Ação Civil Pública. Contratação Fraudulenta. Cooperativas Internas e Externas.
Quanto à questão da legitimidade do Ministério Público, a Quinta Turma conheceu do tema pelos fundamentos a seguir transcritos:
"Conforme já relatado no tema anterior, o Regional acolheu a preliminar de ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para a propositura da presente Ação Civil Pública, porque na hipótese em exame os direitos pleiteados não são direitos coletivos, mas, sim, reconhecimento de direitos que podem ser perseguidos individualmente (determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados).
Em suas razões recursais, o Ministério Público do Trabalho sustenta que a decisão fere o artigo 81, parágrafo único, e incisos I, II e III, da Lei nº 8.078/90, além de divergir da jurisprudência colacionada, já que detém legitimidade para agir em casos como destes autos.
Os arestos transcritos às fls. 11.296/11.301 caracterizam a pretendida divergência jurisprudencial, na medida em que esposam tese no sentido de que tem o Ministério Público do Trabalho, por força do inciso III do art. 83 da Lei Complementar nº 75/93, legitimidade para ajuizar ação civil pública, buscando a declaração de inidoneidade de cooperativa e abstenção do fornecimento de mão-de-obra por cooperativas irregulares, bem como o reconhecimento de vínculo empregatício com os trabalhadores por elas admitidos".
Conheço por divergência jurisprudencial.
2. Mérito
2.1. Ação Civil Pública. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Contratação Fraudulenta. Cooperativas.
No mérito, ousei divergir do nobre Ministro Rider Nogueira de Brito, relator originário, pelos fundamentos que passo a aduzir.
De início, para o deslinde da controvérsia convém distinguir as três principais formas de interesses que dizem com a capacidade postulatória do Ministério Público:
1. interesses difusos, aqueles de natureza indivisível, cujos titulares são em número indeterminado, mas ligados entre si por uma mera circunstância de fato;
2. interesses coletivos, assim entendidos aqueles de natureza indivisível, cujo titular é um grupo, uma categoria ou classe de indivíduos ligados entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;
3. direitos individuais homogêneos, aquele que têm origem comum. Estes, em que pese se possa individualizar seus titulares, cuida-se de espécie do gênero interesses coletivos, visto que a lesão, in casu, atinge, potencialmente, todos os membros de uma dada coletividade.
De comum, possuem a possibilidade de serem tutelados na modalidade coletiva, por meio de ação do Ministério Público do Trabalho. Assim é porque os primeiros e os segundos podem, ocasionalmente, englobar os terceiros. A lesão em relação aos direitos difusos e aos direitos coletivos é virtual, isto é, atinge potencialmente todo o grupo, enquanto, nos individuais homogêneos, a lesão é efetiva a alguns membros do grupo.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região decretou a extinção do feito sem julgamento do mérito por ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho, ao fundamento de que o pedido deduzido na Ação Civil Pública se restringe a interesses individuais, consubstanciado no pedido inicial de reconhecimento de vínculo empregatício entre os contratados pelas chamadas "cooperativas externas" diretamente com as "cooperativas internas" – a Cooperpas e a Coopermed.
A hipótese dos autos, conforme se depreende dos termos do acórdão regional, refere-se ao Plano de Atendimento à Saúde (PAS), instituído pelo Município de São Paulo, mediante a edição da Lei Municipal nº 11.866/95. Segundo o texto da Lei Municipal, convênios seriam firmados com duas cooperativas – a Cooperpas e a Coopermed – a serem constituídas exclusivamente por servidores municipais licenciados especificamente para integrarem essas cooperativas, que, por sua vez, foram criadas para implementação do PAS.
Posteriormente, a Cooperpas e a Coopermed firmaram convênios com outras cooperativas (cooperativas externas), por intermédio das quais diversos trabalhadores foram contratados na qualidade de cooperados, para prestarem serviços junto ao PAS.
Dada a intermediação de mão-de-obra que se parece afigurar no quadro fático delineado, o Ministério Público pretendeu demonstrar nesta Ação Civil Pública a formação de vínculo de emprego diretamente entre as chamadas "cooperativas internas" e os trabalhadores contratados pelas "cooperativas externas".
Contudo, os pedidos não se limitaram ao reconhecimento de vínculo.
O Ministério Público do Trabalho formula os seguintes pedidos, entre outros:
a) abstenção de contratação de mão-de-obra por intermédio de cooperativa fraudulenta;
b) declaração de inidoneidade das cooperativas externas; e
c) reconhecimento do vínculo empregatício em relação aos pseudocooperados.
A Ação Civil Pública em apreço, portanto, não se restringe ao reconhecimento de vínculos.
Prescreve o art. 129, inciso III, da Constituição da República:
"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I – (...);
II – (...);
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção dos patrimônios público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;" (grifos nossos)
Diante da competência constitucional atribuída ao Ministério Público, e em razão dela, é que se fez constar da Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar nº 75/93) os artigos 83, inciso III, e 84, inciso II, dos quais se extrai a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para a tutela de interesses difusos e coletivos perante a Justiça do Trabalho. Transcrevo.
"Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos Órgãos da Justiça do Trabalho:
III – promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos;
(...)
Art. 84. Incumbe ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito das suas atribuições, exercer as funções institucionais previstas nos Capítulos I, II, III e IV do Título I, especialmente:
II – instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para assegurar a observância dos direitos sociais dos trabalhadores."
Aqui, à vista da competência que foi atribuída nos artigos 129, inciso III, da Constituição da República e 83, inciso III, e 84, inciso II, da Lei Complementar
nº 75/93, o Ministério Público do Trabalho que tutelar, em primeiro lugar, interesses difusos, caracterizados, particularmente, pelas circunstâncias de fato, implicando um número indefinido e, por isso, não identificável de indivíduos que compõem a sociedade onde os serviços municipais são prestados. E em que medida se dá essa tutela de interesses difusos? Na medida em que o Município, a permanecer com a prática de contratação de empregados por intermédio das chamadas "cooperativas externas", estará se servindo de mão-de-obra contratada sem o obrigatório concurso público. Na hipótese, a Ação Civil Pública no Juízo Trabalhista justifica-se para defender os potenciais postulantes do emprego via concurso público; portanto, uma coletividade que poderia se habilitar ao ingresso nos Quadros da Administração Pública para a prestação do serviço de saúde que se pretendeu implantar, a princípio, só com servidores públicos municipais. Nessa perspectiva – ausência de concurso público –, não há qualquer vínculo jurídico entre os interessados (todos os cidadãos), mas há a circunstância de fato que reúne seus interesses, porque de todos está sendo tolhido o direito de ingresso no serviço público mediante aprovação em concurso público, consoante determina o art. 37, inciso II, da Constituição da República.
Por outro lado, a fim de estabelecer a legitimidade do Ministério Público, devem ser considerados os pedidos efetivamente deduzidos na inicial.
Primeiramente, a pretensão de reconhecimento de vínculo entre os "cooperados" contratados e as cooperativas internas, a meu juízo, não se insere no conceito de interesses difusos ou coletivos.
Entretanto, quanto aos dois primeiros pedidos, visando impor declaração de inidoneidade das cooperativas externas e obrigação de não fazer, entendo estarem situados na definição de interesses difusos e coletivos.
No que diz respeito à declaração de inidoneidade das cooperativas externas, a tutela de interesses coletivos insere-se na proteção aos pseudocooperados, visto que, na argumentação do Ministério Público, não se poderia admitir intermediação de mão-de-obra por "cooperativas de fachada" em situação de fraude à lei e de prejuízo aos trabalhadores aliciados, quando a eles é imposta a condição de "cooperados". Nessa esteira, o pedido de declaração de inidoneidade é corolário da eventual constatação da fraude que vem sendo perpetrada pelas ditas cooperativas externas.
Também o pedido de abstenção de contratação de mão-de-obra por intermédio de cooperativas contratadas em substituição àquelas às quais foi atribuída a tarefa de implantação do Plano de Atendimento à Saúde (PAS) – Lei Municipal
nº 11.766/95 – refere-se a interesses difusos e coletivos. Conforme já assinalado, houve a terceirização dos serviços da Cooperpas e da Coopermed, por intermédio de contratação de outras cooperativas – "cooperativas externas" – que contratam indivíduos fora da qualificação exigida na lei para a prestação dos serviços via convênio.
A corroborar a moldura coletiva dos interesses defendidos na espécie, tem-se a lição de Ada Pellegrini Grinover, para quem, interesses coletivos são "interesses comuns a uma coletividade de pessoas e apenas a elas, mas repousando sobre o vínculo jurídico que as congrega" (apud A Defesa dos Direitos Metaindividuais no Processo do Trabalho, Anais – TRT – 3ª Região, MPT 3ª Região e OAB – Seção Minas Gerais).
E assim o é porque, se considerarmos ter havido terceirização dos serviços da Cooperpas e da Coopermed, por intermédio de contratação de outras cooperativas – "cooperativas externas" – que, por sua vez, contratam trabalhadores e a eles impõem a condição de "cooperados" (daí pseudocooperados), chega-se à conclusão de que o Ministério Público defende interesse de um grupo de pseudocooperados lesados no que diz respeito aos direitos trabalhistas porque, enquanto cooperados, são excluídos dos benefícios emergentes do contrato de trabalho.
Nos interesses coletivos, os interessados (pseudocooperados) vinculam-se entre si e com a outra parte, por uma relação jurídica preexistentes à propositura da ação. Assim, consoante a definição da Professora Ada Pellegrini Grinover, temos que o grupo de pseudocooperados é a coletividade de pessoas que se vinculam pela mesma situação jurídica de "contratados das cooperativas externas".
Nesse cenário, a Ação Civil Pública traz a pretensão de dar um fim a esse procedimento de contratação com imposição da condição de "cooperado".
Diante das razões expostas, o pedido de declaração de inidoneidade das "cooperativas externas" e de abstenção da prática de terceirização se insere na defesa de interesses coletivos e difusos. E tais pedidos encontram-se consubstanciados nas letras a, b, c, d, e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70).
Assim, dou parcial provimento, a fim de reconhecer a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho na presente Ação Civil Pública, apenas em relação aos pedidos a, b, c, d e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70), e, via de conseqüência, determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional de origem para prosseguir no julgamento da ação.
Isto posto, acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Recurso, apenas quanto ao tema "Legitimidade do Ministério Público do Trabalho – Ação Civil Pública – Vínculo de Emprego – Contratação Fraudulenta – Cooperativas Internas e Externas", por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, afim de reconhecer a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho na presente Ação Civil Pública, apenas em relação aos pedidos a, b, c, d e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70), e, via de conseqüência, determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional de origem, para prosseguir no julgamento da ação, vencido o Exmo. Sr. Ministro Rider Nogueira de Brito.
Brasília, 17 de abril de 2002.
João Batista Brito Pereira
Ministro-Redator designado
RDT nº 09 - setembro de 2002
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PROCESSO TST-RR Nº 743.929/2001-0
Acórdão – 5ª Turma
EMENTA
Ação civil pública – Contratação fraudulenta – Cooperativas – Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Lei Municipal que implanta Plano de Atendimento à Saúde (PAS) por intermédio de cooperativas (cooperativas internas) a serem constituídas por servidores públicos municipais licenciados para esse fim específico. 1. Posterior contratação, pelas cooperativas internas, de outras cooperativas internas, de outras cooperativas (cooperativas externas), não previstas no plano original, por meio das quais se arregimentavam trabalhadores para efetiva implementação do PAS e a eles impunha-se a condição de “cooperados”. 2. Legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho para propositura de Ação Civil Pública na qual se deduz, fundamentalmente, três pedidos: a) abstenção de contratação de mão-de-obra por meio das cooperativas externas; b) declaração de inidoneidade dessas cooperativas e; c) reconhecimento do vínculo empregatício entre os pseudocooperados e as cooperativas internas. 3. Defesa de interesses difusos e coletivos. 4. Pedido de reconhecimento de vínculo que não se insere no conceito de interesses difusos ou coletivos. 6. Pedidos de abstenção de contratação de mão-de-obra por meio das cooperativas externas e declaração de inidoneidade dessas cooperativas que dizem com a capacidade postulatória do Ministério Público do Trabalho na defesa de interesses difusos, interesses coletivos e direitos individuais homogêneos, visto que, de comum, possuem a possibilidade de serem tutelados na modalidade coletiva, por intermédio de ação do Ministério Público do Trabalho. Assim é, porque os primeiros e os segundos podem, ocasionalmente, englobar os terceiros. 7. Trata-se de interesses difusos na medida em que o Município, a permanecer com a prática de contratação de empregados por intermédio das chamadas “cooperativas externas”, estará se servindo de mão-de-obra contratada sem o obrigatório concurso público, tolhendo o direito de toda uma coletividade de se habilitar para o ingresso no serviço público, nos moldes em que prescreve o art. 37, inciso II, da Constituição da República. 8. São interesses coletivos quando, havendo intermediação de mão-de-obra pelas cooperativas externas, aos trabalhadores aliciados é imposta a condição de “cooperados”, excluindo-os, assim, dos benefícios emergentes do contrato de trabalho. 9. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho que encontra respaldo na competência a ele atribuída pelos artigos 129, inciso III, da Constituição da República e 83, inciso III, e 84, inciso II, da Lei Complementar
nº 75/93. 10. Recurso de revista conhecido e a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista TST-RR nº 743.929/2001.0, em que é recorrente Ministério Público do Trabalho da 2ª Região e recorridos Município de São Paulo, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Superior – Cooperpas Sup 4 e Outros, Cooperadps – Cooperativa dos Profissionais de Saúde, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Coopermed 3 e Outros, Coopermedic de São Paulo – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, Paramédica Sociedade Cooperativa de Trabalho dos Auxiliares de Serviços de Saúde e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Superior – Cooperpas 2, Cooperativa dos Profissionais da Saúde – Cooperplus 2, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Técnico – Cooperpas Tec. 1 e Outros, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Cooperplus 11 e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde – Cooperpas 9 e Outros, Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Coopermed 2 e Outro, Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Superior – Cooperpas 12, Cooperativa dos Profissionais de Saúde de Nível Médio e Superior – Cooperplus 12, Cooperativa Complementar à Saúde – Coopersaúde e Cooperext – Cooperativa de Profissionais de Saúde.
“O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, pelo acórdão de fls. 11.267/11.273 (36º v.), acolheu a preliminar de falta de legitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor a presente Ação Civil Pública e, em conseqüência, julgou extinto o processo, sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, inciso VI, do CPC.
O Regional, examinando a inicial, consignou que o Ministério Público do Trabalho: 1) propôs Ação Civil Pública contra as Cooperativas Externas e Internas do Plano de Atendimento à Saúde (PAS) e o Município de São Paulo, aduzindo que, para o atendimento ao PAS, formaram-se 2 (duas) espécies de cooperativas de trabalho, a primeira, denominada de Cooperativa Interna, formada exclusivamente por funcionários públicos municipais licenciados, que se organizaram na Cooperpas/Tec (formada por profissionais da saúde de nível técnico) e na Cooperpas/Méd (formada por profissionais da saúde da classe médica), e a segunda, denominada de Cooperativa Externa, constituída por trabalhadores não integrantes do quadro de servidores públicos municipais; 2) na mencionada inicial, argumentou que, com base nos fatos averiguados pela Delegacia Regional do Trabalho e pelo próprio Ministério Público do Trabalho, constatou-se que as cooperativas externas foram criadas, especificamente, para funcionar como intermediadoras de mão-de-obra utilizada pelas cooperativas internas, com evidente fraude à lei, uma vez que as reais empregadoras dos trabalhadores, falsamente admitidos como cooperados, são a Cooperpas e a Coopermed; e 3) diante dos fatos acima narrados, pediu a declaração do vínculo empregatício dos trabalhadores admitidos através das falsas cooperativas (cooperativas externas) diretamente com a Cooperpas e a Coopermed a que estivessem vinculados, com o reconhecimento de todas as verbas trabalhistas decorrentes do pacto laboral, e por padecer de vícios tais atos, deve o Município de São Paulo, na qualidade de responsável subsidiário pelos serviços realizados, proibir tal prática.
A egrégia Corte de origem, analisando o disposto nos artigos 129, inciso III, da CF/88; 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; 81, parágrafo único, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); e 1º, inciso IV, da Lei
nº 7.347/85, concluiu pela ilegitimidade do Ministério Público para propor a demanda, pois, na espécie, não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que o acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Acrescentou que, ao se postular a determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam no âmbito dos interesses individuais.
O Ministério Público do Trabalho opôs Embargos de Declaração (fls. 11.277/11.280), postulando os seguintes esclarecimentos: 1) caracterização do pedido de “abstenção, por parte das cooperativas internas, de terceirizar os serviços ilicitamente” na qualificação de direito individual, ou seja, em que medida a extensão da prática lesiva pode ser individualizada, mormente considerando-se a continuidade da prática a atingir a atual coletividade de trabalhadores e aqueles, não identificáveis, que futuramente serão lesados pela ilicitude relatada; 2) análise da caracterização constante do acórdão embargado à luz do artigo 81, § 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90, que conceitua interesses difusos e coletivos; e 3) por qual razão o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício a todos os lesados é circunscrito à esfera meramente individual, à luz do artigo 81, inciso III, da mencionada Lei, no qual consta que interesses individuais homogêneos são aqueles “decorrentes de origem comum”.
Em resposta, o egrégio TRT de origem rejeitou-os por entender que a questão relativa à legitimidade do Ministério Público do Trabalho para a propositura da ação foi claramente explicitada e fundamentada no acórdão embargado, pelo que o julgado embargado não padecia dos vícios de obscuridade, dúvida ou contradição (fls. 11.282/11.284).
O Ministério Público do Trabalho interpõe Recurso de Revista às fls. 11.288/11.310, com fulcro no artigo 896, alíneas a e c, da CLT. Argúi, preliminarmente, a nulidade do acórdão do Regional por negativa de prestação jurisdicional, apontando violação dos artigos 93, IX, da CF/88, e 832 da CLT, bem como transcrevendo julgados ao cotejo. Argumenta que o Regional, mesmo com a oposição de Embargos de Declaração, não se manifestou acerca: 1) da caracterização dos pedidos de abstenção de contratar através de cooperativas fraudulentas e de reconhecimento do vínculo empregatício dos pseudo-cooperados ante a fraude à lei perpetrada, à luz do artigo 81, parágrafo único, da Lei
nº 8.078/90, o qual define os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos; e 2) dos fundamentos que justificam a conceituação e definição jurídica dos direitos contidos no pedido como individuais, limitando-se a taxá-los como tal. Quanto à legitimidade do Ministério Público para propor a presente Ação Civil Pública, indica ofensa aos incisos I, II e III, do parágrafo único, do artigo 81 da Lei nº 8.078/90, e apresenta arestos para confronto de teses.
Despacho de admissibilidade à fl. 11.311.
Contra-razões apresentadas, pelo Município de São Paulo (fls. 11.316/11.318); pela Cooperativa dos Profissionais da Saúde de Nível Médio – Cooperpas Méd 4 (fls. 11.320/11.327); pela Cooperativa dos Profissionais de Saúde – Cooperadps (fls. 11.328/11.330); e pela Cooperpas 8 – Cooperativa de Profissionais da Saúde, na qualidade de incorporadora das Cooperativas de Trabalho de Nível Universitário que atuam na área de saúde, Cooperpas 7, Cooperpas 15, Coopermed 8 – Cooperativa dos Profissionais de Nível Médio da Saúde, incorporadora da Coopermed 7 – Cooperativa dos Profissionais de Nível Médio da Saúde, Coopermed 15 – Cooperativa de Trabalho dos Profissionais em Nível Médio, Básico e Operacional que atuam na área de saúde, Coopermed 11 – Cooperativa dos Profissionais da Saúde Nível Médio, Cooperart – Cooperativa dos Profissionais Autônomos, Coopasa – Cooperativa de Profissionais de Apoio à Saúde, Coopermult/São Miguel Paulista – Cooperativa de Profissionais da Saúde e Coprol – Cooperativa de Profissionais Liberais de São Paulo (fls. 11.331/11.340).
Os presentes autos deixaram de ser remetidos ao Ministério Público do Trabalho, por se tratar de ação originária em que ele é autor (art. 113, § 1º, inciso I, do RITST)”.
É o relatório, conforme aprovado em sessão.
VOTO
Preenchidos os pressupostos genéricos de admissibilidade do Recurso de Revista, passo ao exame dos intrínsecos.
1 – Conhecimento
1.1 – Preliminar de nulidade do Acórdão do Regional. Negativa de prestação jurisdicional.
Em voto da lavra do nobre Ministro Rider Nogueira de Brito, a Quinta Turma não conheceu de nulidade consoante os seguintes fundamentos assim lançados pelo relator originário:
“A egrégia Corte de origem, analisando o disposto nos artigo 129, inciso III, da CF/88; 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; 81, parágrafo único, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); e 1º, inciso IV, da Lei
nº 7.347/85, concluiu pela ilegitimidade do Ministério Público para propor a demanda, pois, na espécie, não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que o acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Acrescentou que, ao se postular a determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudo-cooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam no âmbito dos interesses individuais (fls. 11.270/11.273).
Dessa decisão, o Ministério Público do Trabalho opôs Embargos de Declaração (fls. 11.277/11.280), postulando os seguintes esclarecimentos: 1) caracterização do pedido de “abstenção, por parte das cooperativas internas, de terceirizar os serviços ilicitamente” na qualificação de direito individual, ou seja, em que medida a extensão da prática lesiva pode ser individualizada, mormente considerando-se a continuidade da prática a atingir a atual coletividade de trabalhadores e aqueles, não identificáveis, que futuramente serão lesados pela ilicitude relatada; 2) análise da caracterização constante do acórdão embargado à luz do artigo 81, § 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.078/90, que conceitua interesses difusos e coletivos; e 3) por qual razão o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício a todos os lesados é circunscrito à esfera meramente individual, à luz do artigo 81, inciso III, da mencionada Lei, no qual consta que interesses individuais homogêneos são aqueles “decorrentes de origem comum”.
Em resposta, o egrégio TRT de origem rejeitou-os, nos seguintes termos:
“Na composição da lide, por operação dialética, basta ao julgador reunir os pontos relevantes sobre os quais fundamentadamente, se deve pronunciar, não havendo necessidade de se apreciar, ponto por ponto, os argumentos expendidos pelas partes. Assim, o Juízo deve solucionar todas as questões de fato ou de direito que lhe são apresentadas, decidindo-as de forma fundamentada (artigo 93, IX, da Constituição Federal de 1988 e artigo 832 da CLT).
Entretanto, na hipótese em exame, a questão de legitimidade de parte do Parquet para a propositura da presente ação acha-se claramente explicitada e fundamentada no v. Acórdão embargado, inclusive para fins de prequestionamento. Os critérios de qualificação jurídica dos fatos postos em Juízo pelos litigantes, não cabem nos limites dos embargados de declaração.
Como a prestação jurisdicional foi devidamente entregue, não padecendo o v. Acórdão embargado de obscuridade, dúvida ou contradição, não há como se dar provimento aos presentes embargos de declaração, na medida em que não observados os limites do artigo 535 do CPC, que estabelecem o seu cabimento” (fls. 11.283/11.284).
O Ministério Público, em suas razões de revista, sustenta que, mesmo com a oposição de Embargos de Declaração, o Regional não se manifestou acerca: 1) da caracterização dos pedidos de abstenção de contratar através de cooperativas fraudulentas e de reconhecimento do vínculo empregatício dos pseudo-cooperados ante a fraude à lei perpetrada, à luz do artigo 81, parágrafo único, da Lei nº 8.078/90, o qual define os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos; e 2) dos fundamentos que justificam a conceituação e definição jurídica dos direitos contidos no pedido como individuais, limitando-se a taxá-los como tal. Reputa ofendidos os artigos 93, IX, da CF/88, e 832 da CLT, bem como transcreve julgados ao cotejo.
Quanto a este tema, o Recurso não merece prosperar.
Com efeito, a egrégia Corte Regional, apreciando as razões apresentadas, tanto no Recurso ordinário como nos Embargos Declaratórios, emitiu detalhadamente toda a fundamentação necessária, ao acolher a preliminar de ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para propor a ação cível pública, notadamente, a respeito do enquadramento do pedido constante na inicial e definição jurídica destes como individuais às fls. 11.271 (segundo ao último parágrafo), 11.272 (primeiro parágrafo), e 11.273 (terceiro e quarto parágrafos), conforme se pode verificar do trecho a seguir transcrito:
“(…)
A questão que se indaga é se os pedidos da presente ação estão contidos nos limites em que legitimado o Ministério Público do Trabalho para agir.
Reza o artigo 129 da Constituição Federal de 1988:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
(…)
III – promover o inquérito civil e ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
A Lei Orgânica do Ministério Público reserva ao Ministério Público do Trabalho a legitimação para a propositura da ação civil pública, sendo que atuação do Órgão deve ocorrer nesta Justiça Trabalhista.
Atente-se para o artigo 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, que assim dispõe:
Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:
(…)
III – Promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para a defesa dos interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionais garantidos.
A ação civil pública, instituto regido pela Lei nº 7.347/85, teve seus limites ampliados pelo Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, que adicionou o inciso IV ao artigo 1º da Lei nº 7.347/85, no qual se coloca sob a égide da ação civil pública ‘qualquer outro interesse difuso ou coletivo’.
Por outro lado, a definição de interesses difusos e coletivos se encontra também no Código de Defesa do Consumidor, e se dá nos seguintes termos:
Art. 81. (…)
Parágrafo único
(…)
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeito deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
(…)
Tecidas essas considerações, a própria inicial revela que com a presente ação não se está a defender interesses difusos ou coletivos, na medida em que a acionante pretende o reconhecimento de direitos trabalhistas individuais, que necessitam de uma ampla fase probatória, para análise de cada caso concreto. Ao se postular que se determine que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e que as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados, os interesses em litígio ultrapassam o patamar dos direitos coletivos e difusos e se projetam ao âmbito dos interesses individuais.
De tudo isso se conclui, data venia do entendimento da d. Vara de origem, que na hipótese em exame os direitos pleiteados não são direitos coletivos de molde a atribuir legitimidade ao Ministério Público para promover a defesa dos seus interesses, mas reconhecimento de direitos que individualmente podem ser perseguidos.
Tem-se, in casu, discussão sobre direitos individuais, fora do âmbito ‘individuais homogêneos’ pelo que haveria de ser decretada ab initio a ilegitimidade da recorrente” (fls. 11.271/11.273).
Como se vê, a prestação jurisdicional foi plenamente entregue, embora de forma diversa da pretendida.
Assim, incólumes os artigos 93, inciso IX, da CF/88, e 832 da CLT. Saliente-se, ainda, ser despicienda a análise da alegada divergência jurisprudencial (fls. 315/316), diante do que consagra a OJ
nº 115 da SBDI-1 desta Corte.
Não conheço da preliminar.
1.2. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Ação Civil Pública. Contratação Fraudulenta. Cooperativas Internas e Externas.
Quanto à questão da legitimidade do Ministério Público, a Quinta Turma conheceu do tema pelos fundamentos a seguir transcritos:
“Conforme já relatado no tema anterior, o Regional acolheu a preliminar de ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho para a propositura da presente Ação Civil Pública, porque na hipótese em exame os direitos pleiteados não são direitos coletivos, mas, sim, reconhecimento de direitos que podem ser perseguidos individualmente (determinação para que as cooperativas internas se abstenham de terceirizar os serviços das pseudocooperativas e as cooperativas internas sejam condenadas a efetuar o registro dos trabalhadores que lhe estiverem e/ou estejam prestando serviços subordinados).
Em suas razões recursais, o Ministério Público do Trabalho sustenta que a decisão fere o artigo 81, parágrafo único, e incisos I, II e III, da Lei nº 8.078/90, além de divergir da jurisprudência colacionada, já que detém legitimidade para agir em casos como destes autos.
Os arestos transcritos às fls. 11.296/11.301 caracterizam a pretendida divergência jurisprudencial, na medida em que esposam tese no sentido de que tem o Ministério Público do Trabalho, por força do inciso III do art. 83 da Lei Complementar nº 75/93, legitimidade para ajuizar ação civil pública, buscando a declaração de inidoneidade de cooperativa e abstenção do fornecimento de mão-de-obra por cooperativas irregulares, bem como o reconhecimento de vínculo empregatício com os trabalhadores por elas admitidos”.
Conheço por divergência jurisprudencial.
2. Mérito
2.1. Ação Civil Pública. Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Contratação Fraudulenta. Cooperativas.
No mérito, ousei divergir do nobre Ministro Rider Nogueira de Brito, relator originário, pelos fundamentos que passo a aduzir.
De início, para o deslinde da controvérsia convém distinguir as três principais formas de interesses que dizem com a capacidade postulatória do Ministério Público:
1. interesses difusos, aqueles de natureza indivisível, cujos titulares são em número indeterminado, mas ligados entre si por uma mera circunstância de fato;
2. interesses coletivos, assim entendidos aqueles de natureza indivisível, cujo titular é um grupo, uma categoria ou classe de indivíduos ligados entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;
3. direitos individuais homogêneos, aquele que têm origem comum. Estes, em que pese se possa individualizar seus titulares, cuida-se de espécie do gênero interesses coletivos, visto que a lesão, in casu, atinge, potencialmente, todos os membros de uma dada coletividade.
De comum, possuem a possibilidade de serem tutelados na modalidade coletiva, por meio de ação do Ministério Público do Trabalho. Assim é porque os primeiros e os segundos podem, ocasionalmente, englobar os terceiros. A lesão em relação aos direitos difusos e aos direitos coletivos é virtual, isto é, atinge potencialmente todo o grupo, enquanto, nos individuais homogêneos, a lesão é efetiva a alguns membros do grupo.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região decretou a extinção do feito sem julgamento do mérito por ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho, ao fundamento de que o pedido deduzido na Ação Civil Pública se restringe a interesses individuais, consubstanciado no pedido inicial de reconhecimento de vínculo empregatício entre os contratados pelas chamadas “cooperativas externas” diretamente com as “cooperativas internas” – a Cooperpas e a Coopermed.
A hipótese dos autos, conforme se depreende dos termos do acórdão regional, refere-se ao Plano de Atendimento à Saúde (PAS), instituído pelo Município de São Paulo, mediante a edição da Lei Municipal nº 11.866/95. Segundo o texto da Lei Municipal, convênios seriam firmados com duas cooperativas – a Cooperpas e a Coopermed – a serem constituídas exclusivamente por servidores municipais licenciados especificamente para integrarem essas cooperativas, que, por sua vez, foram criadas para implementação do PAS.
Posteriormente, a Cooperpas e a Coopermed firmaram convênios com outras cooperativas (cooperativas externas), por intermédio das quais diversos trabalhadores foram contratados na qualidade de cooperados, para prestarem serviços junto ao PAS.
Dada a intermediação de mão-de-obra que se parece afigurar no quadro fático delineado, o Ministério Público pretendeu demonstrar nesta Ação Civil Pública a formação de vínculo de emprego diretamente entre as chamadas “cooperativas internas” e os trabalhadores contratados pelas “cooperativas externas”.
Contudo, os pedidos não se limitaram ao reconhecimento de vínculo.
O Ministério Público do Trabalho formula os seguintes pedidos, entre outros:
a) abstenção de contratação de mão-de-obra por intermédio de cooperativa fraudulenta;
b) declaração de inidoneidade das cooperativas externas; e
c) reconhecimento do vínculo empregatício em relação aos pseudocooperados.
A Ação Civil Pública em apreço, portanto, não se restringe ao reconhecimento de vínculos.
Prescreve o art. 129, inciso III, da Constituição da República:
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I – (…);
II – (…);
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção dos patrimônios público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;” (grifos nossos)
Diante da competência constitucional atribuída ao Ministério Público, e em razão dela, é que se fez constar da Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar nº 75/93) os artigos 83, inciso III, e 84, inciso II, dos quais se extrai a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho para a tutela de interesses difusos e coletivos perante a Justiça do Trabalho. Transcrevo.
“Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos Órgãos da Justiça do Trabalho:
III – promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos;
(…)
Art. 84. Incumbe ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito das suas atribuições, exercer as funções institucionais previstas nos Capítulos I, II, III e IV do Título I, especialmente:
II – instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para assegurar a observância dos direitos sociais dos trabalhadores.”
Aqui, à vista da competência que foi atribuída nos artigos 129, inciso III, da Constituição da República e 83, inciso III, e 84, inciso II, da Lei Complementar
nº 75/93, o Ministério Público do Trabalho que tutelar, em primeiro lugar, interesses difusos, caracterizados, particularmente, pelas circunstâncias de fato, implicando um número indefinido e, por isso, não identificável de indivíduos que compõem a sociedade onde os serviços municipais são prestados. E em que medida se dá essa tutela de interesses difusos? Na medida em que o Município, a permanecer com a prática de contratação de empregados por intermédio das chamadas “cooperativas externas”, estará se servindo de mão-de-obra contratada sem o obrigatório concurso público. Na hipótese, a Ação Civil Pública no Juízo Trabalhista justifica-se para defender os potenciais postulantes do emprego via concurso público; portanto, uma coletividade que poderia se habilitar ao ingresso nos Quadros da Administração Pública para a prestação do serviço de saúde que se pretendeu implantar, a princípio, só com servidores públicos municipais. Nessa perspectiva – ausência de concurso público –, não há qualquer vínculo jurídico entre os interessados (todos os cidadãos), mas há a circunstância de fato que reúne seus interesses, porque de todos está sendo tolhido o direito de ingresso no serviço público mediante aprovação em concurso público, consoante determina o art. 37, inciso II, da Constituição da República.
Por outro lado, a fim de estabelecer a legitimidade do Ministério Público, devem ser considerados os pedidos efetivamente deduzidos na inicial.
Primeiramente, a pretensão de reconhecimento de vínculo entre os “cooperados” contratados e as cooperativas internas, a meu juízo, não se insere no conceito de interesses difusos ou coletivos.
Entretanto, quanto aos dois primeiros pedidos, visando impor declaração de inidoneidade das cooperativas externas e obrigação de não fazer, entendo estarem situados na definição de interesses difusos e coletivos.
No que diz respeito à declaração de inidoneidade das cooperativas externas, a tutela de interesses coletivos insere-se na proteção aos pseudocooperados, visto que, na argumentação do Ministério Público, não se poderia admitir intermediação de mão-de-obra por “cooperativas de fachada” em situação de fraude à lei e de prejuízo aos trabalhadores aliciados, quando a eles é imposta a condição de “cooperados”. Nessa esteira, o pedido de declaração de inidoneidade é corolário da eventual constatação da fraude que vem sendo perpetrada pelas ditas cooperativas externas.
Também o pedido de abstenção de contratação de mão-de-obra por intermédio de cooperativas contratadas em substituição àquelas às quais foi atribuída a tarefa de implantação do Plano de Atendimento à Saúde (PAS) – Lei Municipal
nº 11.766/95 – refere-se a interesses difusos e coletivos. Conforme já assinalado, houve a terceirização dos serviços da Cooperpas e da Coopermed, por intermédio de contratação de outras cooperativas – “cooperativas externas” – que contratam indivíduos fora da qualificação exigida na lei para a prestação dos serviços via convênio.
A corroborar a moldura coletiva dos interesses defendidos na espécie, tem-se a lição de Ada Pellegrini Grinover, para quem, interesses coletivos são “interesses comuns a uma coletividade de pessoas e apenas a elas, mas repousando sobre o vínculo jurídico que as congrega” (apud A Defesa dos Direitos Metaindividuais no Processo do Trabalho, Anais – TRT – 3ª Região, MPT 3ª Região e OAB – Seção Minas Gerais).
E assim o é porque, se considerarmos ter havido terceirização dos serviços da Cooperpas e da Coopermed, por intermédio de contratação de outras cooperativas – “cooperativas externas” – que, por sua vez, contratam trabalhadores e a eles impõem a condição de “cooperados” (daí pseudocooperados), chega-se à conclusão de que o Ministério Público defende interesse de um grupo de pseudocooperados lesados no que diz respeito aos direitos trabalhistas porque, enquanto cooperados, são excluídos dos benefícios emergentes do contrato de trabalho.
Nos interesses coletivos, os interessados (pseudocooperados) vinculam-se entre si e com a outra parte, por uma relação jurídica preexistentes à propositura da ação. Assim, consoante a definição da Professora Ada Pellegrini Grinover, temos que o grupo de pseudocooperados é a coletividade de pessoas que se vinculam pela mesma situação jurídica de “contratados das cooperativas externas”.
Nesse cenário, a Ação Civil Pública traz a pretensão de dar um fim a esse procedimento de contratação com imposição da condição de “cooperado”.
Diante das razões expostas, o pedido de declaração de inidoneidade das “cooperativas externas” e de abstenção da prática de terceirização se insere na defesa de interesses coletivos e difusos. E tais pedidos encontram-se consubstanciados nas letras a, b, c, d, e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70).
Assim, dou parcial provimento, a fim de reconhecer a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho na presente Ação Civil Pública, apenas em relação aos pedidos a, b, c, d e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70), e, via de conseqüência, determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional de origem para prosseguir no julgamento da ação.
Isto posto, acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Recurso, apenas quanto ao tema “Legitimidade do Ministério Público do Trabalho – Ação Civil Pública – Vínculo de Emprego – Contratação Fraudulenta – Cooperativas Internas e Externas”, por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, afim de reconhecer a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho na presente Ação Civil Pública, apenas em relação aos pedidos a, b, c, d e e (fls. 67/68) e a, b, e, f e g (fls. 69/70), e, via de conseqüência, determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional de origem, para prosseguir no julgamento da ação, vencido o Exmo. Sr. Ministro Rider Nogueira de Brito.
Brasília, 17 de abril de 2002.
João Batista Brito Pereira
Ministro-Redator designado
RDT nº 09 – setembro de 2002
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