TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 3ª R        COMISSÕES – PARCELA CORRESPONDENTE À META DE VENDAS – Advocacia Trabalhista Curitiba – Zavadniak & Honorato Advogados Trabalhistas Curitiba

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 3ª R COMISSÕES – PARCELA CORRESPONDENTE À META DE VENDAS – Advocacia Trabalhista Curitiba – Zavadniak & Honorato Advogados Trabalhistas Curitiba

 

 

 

RO TRT nº 8.102/2002

 

Recorrente: S.A. Estado de Minas

 

Recorrida: Andréa Fraga Dias Campos

 

EMENTA

 

Comissões – Parcela correspondente à meta de vendas – Não é ilegal a imposição de meta de vendas elevada, vinculando determinada parcela das comissões ao atendimento dessa exigência. A Lei Civil (artigo 115) veda a instituição de condição que privar de todo efeito o ato jurídico, ou sujeitá-lo ao arbítrio exclusivo de uma das partes (condição potestativa pura). Nesses dois casos, a proibição contida na lei atrai a nulidade dos atos vinculados a esses dois tipos de condição. Pode-se mencionar, como exemplo da primeira hipótese, a exigência do locador, como condição à locação, de que o locatário nunca venha a morar no imóvel objeto desse tipo de contrato. Consideram-se, ainda, inexistentes as condições fisicamente impossíveis e as condições de não fazer coisa impossível, conforme o artigo 116 do Código Civil. Um exemplo dessas duas hipóteses seria a imposição de um dos contratantes tocar o céu com o dedo (se digito coelum tetigeris) ou vincular a validade de um ato a nunca mais chover. Por fim, cabe recordar que também é ineficaz o ato jurídico cujo implemento subordina-se a condição juridicamente impossível, considerada como tal aquela proibida em lei (artigo 116), cujo exemplo clássico é si homicidium feceris ou si homicidium no feceris. Se o empregador estipulou meta elevada de anúncios, os quais deveriam ser captados para publicação em jornal de baixa circulação e a prova oral não deixa dúvida quanto à inviabilidade de cumprimento da meta, pois nenhum empregado chegou a alcançá-la em tempo algum, consoante informação da própria preposta, ainda que a condição estabeleça obrigação de difícil implemento, não se enquadra em nenhuma das previsões do Código Civil referidas acima. Não se vislumbra, outrossim, afronta ao princípio da proteção. A imposição da meta de vendas foi adotada pelo empregador dentro do poder diretivo que lhe confere o artigo 2º da CLT, não restando evidenciada a redução salarial. Os elementos dos autos mostram que a autora percebia parcela fixa, acrescida das comissões. O cálculo dessas últimas correspondia a 1,8% do valor dos anúncios, deduzidos 20% do total apurado, em virtude de não ter sido atingida a meta prevista pela empresa. O empregador instituiu, portanto, duas formas de remunerar a produtividade nesse caso. Uma parcela das comissões remunerava pura e simplesmente a venda dos anúncios; a outra parcela – os 20% deduzidos – constituía, na verdade, prêmio pela meta atingida. Se a autora nunca atingiu a previsão de vendas, não poderá reivindicar o percentual ajustado a esse título. Ausente o fato gerador, improcede o salário-condição.

 

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrente, S.A., Estado de Minas e, como recorrida, Andréa Fraga Dias Campos.

 

RELATÓRIO

 

Insurge-se o reclamado, S.A. Estado de Minas, contra a decisão proferida pela MM. 1ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que julgou parcialmente procedente a reclamação ajuizada por Andréa Fraga Dias Campos.

 

Sustenta, às fls. 215/219, ser indevido o pagamento do intervalo de 10 minutos para cada lapso de 50 minutos trabalhado, porque a autora não prestava serviços ininterruptos de digitação. Se assim não se entender, pede a observância do intervalo previsto no artigo 72 da CLT. Requer a exclusão dos reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo intrajornada sobre o aviso prévio, alegando que a condenação abrange lapso muito anterior à dispensa. Aduz que a autora não atingiu as metas de produção, motivo pelo qual o percentual pago a título de comissão está correto, inexistindo diferenças a pagar. Requer, por fim, a exclusão da indenização prevista no artigo 9º da Lei nº 6.708/79.

 

Contra-razões às fls. 222/227.

 

Os autos chegaram a este Tribunal no dia 10.7.2002, sendo distribuídos em 22.7.2002. Desnecessário o parecer escrito da d. Pro-

curadoria, porque ausente interesse público.

 

É o relatório.

 

VOTO

 

O recurso é próprio e tempestivo. As custas e o depósito recursal foram pagos regularmente. Conheço.

 

MÉRITO

 

Intervalos pelo trabalho com digitação

 

A reclamante prestou serviços como digitadora, recebendo anúncios para publicação nos dois jornais mantidos em circulação pelo reclamado. Postulou a obreira o pagamento de horas extras, alegando que o trabalho na digitação era contínuo, sem concessão dos intervalos de dez minutos para cada cinqüenta de atividade. Essa pretensão foi atendida pela r. sentença, com fundamento na NR-17, com redação da Portaria nº 3.751/90.

 

Essa norma constitui um estudo sobre ergonomia e não impõe limitação de jornada para o digitador. A faculdade atribuída ao Ministério do Trabalho pelo artigo 200 da CLT autoriza que este órgão disponha sobre providências e determinações necessárias à regulamentação das condições relativas à proteção do trabalhador dentro do ambiente de trabalho. Não lhe atribui, porém, competência para alterar a jornada de trabalho. Esta matéria, a meu ver, somente pode vir a ser regulamentada por intermédio de lei ordinária. Dessa forma, entendo que a portaria em questão, ao dispor sobre a jornada do digitador, exorbitou sua competência, invadindo a reserva legal. Logo, as limitações nela previstas não prevalecem sobre as normas regulamentadoras da jornada de trabalho existentes na CLT. Entendo, por isso, serem inaplicáveis os intervalos de dez minutos a cada cinqüenta de trabalho.

 

Hão de ser observados, no entanto, os intervalos previstos no artigo 72 da CLT, ou seja, a autora faria jus a descansos de dez minutos para cada noventa de trabalho, devendo receber como extras esses lapsos. Aplicável o Enunciado nº 346 do c. TST.

 

Ao contrário do que alega o reclamado, a prova testemunhal confirma o trabalho ininterrupto de digitação. As duas testemunhas arroladas pela autora confirmaram suas alegações, asseverando que esta última digitava anúncios de forma constante (fls. 94/95). Ademais, a própria preposta chega a reconhecer esse fato, quando diz que nos dias mais apertados sequer havia tempo para descansar (fl. 94). Diante desse quadro, é de todo inviável acolher a informação obtida da única testemunha arrolada pelo reclamado, que negou o serviço constante na digitação.

 

Por todas essas razões, modifico a r. sentença apenas para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho.

 

Reflexos das horas extras sobre o aviso prévio

 

O MM. Juízo de primeiro grau considerou comprovada, pelas testemunhas, a ausência do intervalo de quinze minutos, quando a autora cumpriu jornada de seis horas, até junho de 2001. Deferiu, por isso, o pagamento desse lapso como hora extra, limitada a condenação a 30.6.2001. Foram deferidos, ainda, reflexos sobre férias, 13º salários, aviso prévio, RSR, FGTS + 40%.

 

Insurge-se o reclamado contra o deferimento dos reflexos dessas horas extras sobre o aviso prévio, alegando que a condenação ficou limitada a lapso muito anterior à dispensa.

 

Na verdade a repercussão é indevida, mas por motivo diverso daquele alegado pela empresa. Segundo se infere de fl. 11, o aviso prévio foi trabalhado. A repercussão em estudo somente tem lugar quando o pré-aviso é indenizado, consoante o entendimento contido no Enunciado nº 94 do c. TST. Por essa razão, considero indevidos os reflexos deferidos sob esse título.

 

Modifico a r. sentença nesse aspecto, para excluir da condenação os reflexos sobre o aviso prévio das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido.

 

Comissões

 

As partes concordam que a autora percebia comissões sobre os valores das vendas de anúncios. Consoante informação obtida da primeira testemunha arrolada pela obreira (fl. 94), essa comissão correspondia a 1,8% do valor do anúncio. Acontece que todos os digitadores tinham uma meta de anúncios a cumprir, tanto em relação ao jornal Estado de Minas, como relativamente ao Diário da Tarde. Caso a meta de um desses dois jornais não fosse atingida, o valor das comissões era reduzido em 20%. Apurou-se, ainda, que quase todos os empregados atingiam a meta imposta para o Estado de Minas, ao passo que nenhum deles jamais conseguiu cumprir a meta do Diário da Tarde. A preposta confessa esse fato, como se infere de fl. 94. Ademais, tornou-se incontroversa a alegação de que todos os descontos sofridos pela autora decorreram do fato de não ter sido atingida a meta imposta para o Diário da Tarde, ou seja, resta claro que o empregador valeu-se da restrição referente à meta, ajustada na contratação das comissões.

 

O MM. Juízo de primeiro considerou ilegal a dedução nos valores da comissão. Concluiu o d. Julgador que a meta exigida pelo reclamado era impossível de ser atingida, motivo pelo qual o empregador afrontara o princípio da proteção quando impôs essa condição para pagamento integral das comissões.

 

Não vejo, porém, dessa forma, pois a condição em estudo não encontra óbice em norma legal. A Lei Civil (artigo 115) veda a instituição de condição que privar de todo efeito o ato jurídico, ou sujeitá-lo ao arbítrio exclusivo de uma das partes (condição potestativa pura). A proibição contida na lei atrai a nulidade dos atos vinculados a esses dois tipos de condição. No primeiro caso, trata-se da condição chamada perplexa pela doutrina. Embora não chegue ela a subordinar o negócio jurídico a um fato impossível, cria uma situação contraditória nos seus termos, levando à impossibilidade de realização do ato. Um exemplo seria o locador impor, como condição à locação, que o locatário nunca utilize o imóvel objeto desse tipo de contrato. A segunda hipótese abordada no artigo 115 do Código Civil diz respeito à condição potestativa pura, ou seja, aquela que põe todo o efeito da declaração de vontade na dependência do exclusivo arbítrio daquele a quem o ato interessa e tem como exemplos clássicos si volam ou si volueris (dar-te-ei 100 se eu quiser ou dar-me-ás 100 se quiseres) (cf. Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, v. I, 18. ed., Forense, p. 367).

 

Cabe, ainda, acrescentar que se consideram inexistentes as condições fisicamente impossíveis e as condições de não fazer coisa impossível, conforme o artigo 116 do diploma legal já citado. Um exemplo seria a imposição de um dos contratantes tocar o céu com o dedo (se digito coelum tetigeris) ou vincular a validade de um ato a nunca mais chover. A orientação do legislador foi no sentido de considerar não escritas essas cláusulas, porque, a par de não comprometerem a manifestação de vontade, são ociosas e frívolas, motivo pelo qual, apesar delas, subsiste o ato a que acedem (cf. Vicente Ráo, Ato Jurídico, 4. ed., Revista dos Tribunais, p. 266). Recorde-se, por fim, que há de ser declarado ineficaz o ato jurídico cujo implemento subordina-se a condição juridicamente impossível, considerada como tal aquela proibida em lei (artigo 116). Consoante o ensinamento de Clóvis Bevilácqua, "o direito não pode amparar o que lhe é adverso", decorrendo daí o fundamento dessa ineficácia. O exemplo clássico dessa hipótese é si homicidium feceris ou si homicidium no feceris.

 

No caso em tela, o empregador estipulou meta elevada de anúncios, os quais deveriam ser captados para publicação em jornal de baixa circulação (Diário da Tarde). A prova oral não deixa dúvida quanto à inviabilidade de cumprimento da meta, pois nenhum empregado chegou a alcançá-la em tempo algum, consoante informação da própria preposta. Ainda que a condição estabeleça obrigação de difícil implemento, não se enquadra em nenhuma das previsões referidas acima, pois além de se tratar de ajuste não proibido em lei, nele não se vislumbra contradição ou impossibilidade física.

 

Não vejo, outrossim, afronta ao princípio da proteção. A imposição da meta de vendas foi adotada pelo empregador dentro do poder diretivo que lhe confere o artigo 2º da CLT. Tampouco restou evidenciada a redução salarial. Veja-se que a autora percebia parcela fixa, acrescida das comissões. O cálculo dessas últimas, conforme já acentuado acima, correspondia a 1,8% do valor dos anúncios, deduzidos 20% do total apurado em favor da obreira. Essa dedução devia-se ao fato de não ter sido atingida a meta prevista para o Diário da Tarde. Nota-se que o empregador instituiu duas formas de remunerar a produtividade nesse caso. Uma parcela das comissões remunerava pura e simplesmente a venda dos anúncios; a outra parcela – os 20% deduzidos – constituía, na verdade, prêmio pela meta atingida. Se a autora nunca atingiu a previsão de vendas para um dos jornais, não pode reivindicar essa parcela das comissões.

 

Por todas essas razões, considero indevida a restituição postulada.

 

Indenização adicional

 

A autora foi dispensada em 5.3.2002, após cumprir o aviso prévio recebido no dia 4.2.2002 (fl. 13). A data-base da categoria é 1º de abril, como se infere de fl. 45. Resta claro, portanto, o desligamento ocorrido no trintídio que antecedeu à data-base. Logo, é devida a indenização adicional, faltando com a verdade o reclamado quando diz que o pe-

ríodo do aviso prévio teria remetido a cessação do contrato de trabalho para época posterior à data-base.

 

Nada a prover.

 

Diante do exposto, dou provimento parcial ao recurso do reclamado para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho; provejo, ainda, o apelo, para excluir da condenação a restituição das comissões e os reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido sobre o aviso prévio trabalhado.

 

O valor atribuído à condenação fica mantido.

 

Fundamentos pelos quais, acordam os juízes do Tribunal Regional do Trabalho da

3ª Região, pela sua Segunda Turma, unanimemente, em conhecer do recurso; sem divergência, em dar-lhe provimento parcial para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho, bem como excluir da condenação a restituição das comissões e os reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido sobre o aviso prévio trabalhado, mantido o valor atribuído à condenação.

 

Belo Horizonte, 6 de agosto de 2002.

 

Alice Monteiro de Barros

Presidente ad hoc e Relatora

 

Os RO nºs 3.317/2002 (julgado em 30.4.2002, publicado em 8.5.2002); 8.102/2002 (julgado em 6.8.2002, publicado em 14.8.2002) e 8.298/2002 (julgado em 13.8.2002, publicado em 22.8.2002).

 

RDT nº 1 - janeiro de 2003

 

Advocacia Trabalhista Curitiba – Zavadniak & Honorato Advogados Trabalhistas Curitiba
Advocacia Especializada – Robson Zavadniak advogado
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RO TRT nº 8.102/2002

 

Recorrente: S.A. Estado de Minas

 

Recorrida: Andréa Fraga Dias Campos

 

EMENTA

 

Comissões – Parcela correspondente à meta de vendas – Não é ilegal a imposição de meta de vendas elevada, vinculando determinada parcela das comissões ao atendimento dessa exigência. A Lei Civil (artigo 115) veda a instituição de condição que privar de todo efeito o ato jurídico, ou sujeitá-lo ao arbítrio exclusivo de uma das partes (condição potestativa pura). Nesses dois casos, a proibição contida na lei atrai a nulidade dos atos vinculados a esses dois tipos de condição. Pode-se mencionar, como exemplo da primeira hipótese, a exigência do locador, como condição à locação, de que o locatário nunca venha a morar no imóvel objeto desse tipo de contrato. Consideram-se, ainda, inexistentes as condições fisicamente impossíveis e as condições de não fazer coisa impossível, conforme o artigo 116 do Código Civil. Um exemplo dessas duas hipóteses seria a imposição de um dos contratantes tocar o céu com o dedo (se digito coelum tetigeris) ou vincular a validade de um ato a nunca mais chover. Por fim, cabe recordar que também é ineficaz o ato jurídico cujo implemento subordina-se a condição juridicamente impossível, considerada como tal aquela proibida em lei (artigo 116), cujo exemplo clássico é si homicidium feceris ou si homicidium no feceris. Se o empregador estipulou meta elevada de anúncios, os quais deveriam ser captados para publicação em jornal de baixa circulação e a prova oral não deixa dúvida quanto à inviabilidade de cumprimento da meta, pois nenhum empregado chegou a alcançá-la em tempo algum, consoante informação da própria preposta, ainda que a condição estabeleça obrigação de difícil implemento, não se enquadra em nenhuma das previsões do Código Civil referidas acima. Não se vislumbra, outrossim, afronta ao princípio da proteção. A imposição da meta de vendas foi adotada pelo empregador dentro do poder diretivo que lhe confere o artigo 2º da CLT, não restando evidenciada a redução salarial. Os elementos dos autos mostram que a autora percebia parcela fixa, acrescida das comissões. O cálculo dessas últimas correspondia a 1,8% do valor dos anúncios, deduzidos 20% do total apurado, em virtude de não ter sido atingida a meta prevista pela empresa. O empregador instituiu, portanto, duas formas de remunerar a produtividade nesse caso. Uma parcela das comissões remunerava pura e simplesmente a venda dos anúncios; a outra parcela – os 20% deduzidos – constituía, na verdade, prêmio pela meta atingida. Se a autora nunca atingiu a previsão de vendas, não poderá reivindicar o percentual ajustado a esse título. Ausente o fato gerador, improcede o salário-condição.

 

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrente, S.A., Estado de Minas e, como recorrida, Andréa Fraga Dias Campos.

 

RELATÓRIO

 

Insurge-se o reclamado, S.A. Estado de Minas, contra a decisão proferida pela MM. 1ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que julgou parcialmente procedente a reclamação ajuizada por Andréa Fraga Dias Campos.

 

Sustenta, às fls. 215/219, ser indevido o pagamento do intervalo de 10 minutos para cada lapso de 50 minutos trabalhado, porque a autora não prestava serviços ininterruptos de digitação. Se assim não se entender, pede a observância do intervalo previsto no artigo 72 da CLT. Requer a exclusão dos reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo intrajornada sobre o aviso prévio, alegando que a condenação abrange lapso muito anterior à dispensa. Aduz que a autora não atingiu as metas de produção, motivo pelo qual o percentual pago a título de comissão está correto, inexistindo diferenças a pagar. Requer, por fim, a exclusão da indenização prevista no artigo 9º da Lei nº 6.708/79.

 

Contra-razões às fls. 222/227.

 

Os autos chegaram a este Tribunal no dia 10.7.2002, sendo distribuídos em 22.7.2002. Desnecessário o parecer escrito da d. Pro-

curadoria, porque ausente interesse público.

 

É o relatório.

 

VOTO

 

O recurso é próprio e tempestivo. As custas e o depósito recursal foram pagos regularmente. Conheço.

 

MÉRITO

 

Intervalos pelo trabalho com digitação

 

A reclamante prestou serviços como digitadora, recebendo anúncios para publicação nos dois jornais mantidos em circulação pelo reclamado. Postulou a obreira o pagamento de horas extras, alegando que o trabalho na digitação era contínuo, sem concessão dos intervalos de dez minutos para cada cinqüenta de atividade. Essa pretensão foi atendida pela r. sentença, com fundamento na NR-17, com redação da Portaria nº 3.751/90.

 

Essa norma constitui um estudo sobre ergonomia e não impõe limitação de jornada para o digitador. A faculdade atribuída ao Ministério do Trabalho pelo artigo 200 da CLT autoriza que este órgão disponha sobre providências e determinações necessárias à regulamentação das condições relativas à proteção do trabalhador dentro do ambiente de trabalho. Não lhe atribui, porém, competência para alterar a jornada de trabalho. Esta matéria, a meu ver, somente pode vir a ser regulamentada por intermédio de lei ordinária. Dessa forma, entendo que a portaria em questão, ao dispor sobre a jornada do digitador, exorbitou sua competência, invadindo a reserva legal. Logo, as limitações nela previstas não prevalecem sobre as normas regulamentadoras da jornada de trabalho existentes na CLT. Entendo, por isso, serem inaplicáveis os intervalos de dez minutos a cada cinqüenta de trabalho.

 

Hão de ser observados, no entanto, os intervalos previstos no artigo 72 da CLT, ou seja, a autora faria jus a descansos de dez minutos para cada noventa de trabalho, devendo receber como extras esses lapsos. Aplicável o Enunciado nº 346 do c. TST.

 

Ao contrário do que alega o reclamado, a prova testemunhal confirma o trabalho ininterrupto de digitação. As duas testemunhas arroladas pela autora confirmaram suas alegações, asseverando que esta última digitava anúncios de forma constante (fls. 94/95). Ademais, a própria preposta chega a reconhecer esse fato, quando diz que nos dias mais apertados sequer havia tempo para descansar (fl. 94). Diante desse quadro, é de todo inviável acolher a informação obtida da única testemunha arrolada pelo reclamado, que negou o serviço constante na digitação.

 

Por todas essas razões, modifico a r. sentença apenas para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho.

 

Reflexos das horas extras sobre o aviso prévio

 

O MM. Juízo de primeiro grau considerou comprovada, pelas testemunhas, a ausência do intervalo de quinze minutos, quando a autora cumpriu jornada de seis horas, até junho de 2001. Deferiu, por isso, o pagamento desse lapso como hora extra, limitada a condenação a 30.6.2001. Foram deferidos, ainda, reflexos sobre férias, 13º salários, aviso prévio, RSR, FGTS + 40%.

 

Insurge-se o reclamado contra o deferimento dos reflexos dessas horas extras sobre o aviso prévio, alegando que a condenação ficou limitada a lapso muito anterior à dispensa.

 

Na verdade a repercussão é indevida, mas por motivo diverso daquele alegado pela empresa. Segundo se infere de fl. 11, o aviso prévio foi trabalhado. A repercussão em estudo somente tem lugar quando o pré-aviso é indenizado, consoante o entendimento contido no Enunciado nº 94 do c. TST. Por essa razão, considero indevidos os reflexos deferidos sob esse título.

 

Modifico a r. sentença nesse aspecto, para excluir da condenação os reflexos sobre o aviso prévio das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido.

 

Comissões

 

As partes concordam que a autora percebia comissões sobre os valores das vendas de anúncios. Consoante informação obtida da primeira testemunha arrolada pela obreira (fl. 94), essa comissão correspondia a 1,8% do valor do anúncio. Acontece que todos os digitadores tinham uma meta de anúncios a cumprir, tanto em relação ao jornal Estado de Minas, como relativamente ao Diário da Tarde. Caso a meta de um desses dois jornais não fosse atingida, o valor das comissões era reduzido em 20%. Apurou-se, ainda, que quase todos os empregados atingiam a meta imposta para o Estado de Minas, ao passo que nenhum deles jamais conseguiu cumprir a meta do Diário da Tarde. A preposta confessa esse fato, como se infere de fl. 94. Ademais, tornou-se incontroversa a alegação de que todos os descontos sofridos pela autora decorreram do fato de não ter sido atingida a meta imposta para o Diário da Tarde, ou seja, resta claro que o empregador valeu-se da restrição referente à meta, ajustada na contratação das comissões.

 

O MM. Juízo de primeiro considerou ilegal a dedução nos valores da comissão. Concluiu o d. Julgador que a meta exigida pelo reclamado era impossível de ser atingida, motivo pelo qual o empregador afrontara o princípio da proteção quando impôs essa condição para pagamento integral das comissões.

 

Não vejo, porém, dessa forma, pois a condição em estudo não encontra óbice em norma legal. A Lei Civil (artigo 115) veda a instituição de condição que privar de todo efeito o ato jurídico, ou sujeitá-lo ao arbítrio exclusivo de uma das partes (condição potestativa pura). A proibição contida na lei atrai a nulidade dos atos vinculados a esses dois tipos de condição. No primeiro caso, trata-se da condição chamada perplexa pela doutrina. Embora não chegue ela a subordinar o negócio jurídico a um fato impossível, cria uma situação contraditória nos seus termos, levando à impossibilidade de realização do ato. Um exemplo seria o locador impor, como condição à locação, que o locatário nunca utilize o imóvel objeto desse tipo de contrato. A segunda hipótese abordada no artigo 115 do Código Civil diz respeito à condição potestativa pura, ou seja, aquela que põe todo o efeito da declaração de vontade na dependência do exclusivo arbítrio daquele a quem o ato interessa e tem como exemplos clássicos si volam ou si volueris (dar-te-ei 100 se eu quiser ou dar-me-ás 100 se quiseres) (cf. Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, v. I, 18. ed., Forense, p. 367).

 

Cabe, ainda, acrescentar que se consideram inexistentes as condições fisicamente impossíveis e as condições de não fazer coisa impossível, conforme o artigo 116 do diploma legal já citado. Um exemplo seria a imposição de um dos contratantes tocar o céu com o dedo (se digito coelum tetigeris) ou vincular a validade de um ato a nunca mais chover. A orientação do legislador foi no sentido de considerar não escritas essas cláusulas, porque, a par de não comprometerem a manifestação de vontade, são ociosas e frívolas, motivo pelo qual, apesar delas, subsiste o ato a que acedem (cf. Vicente Ráo, Ato Jurídico, 4. ed., Revista dos Tribunais, p. 266). Recorde-se, por fim, que há de ser declarado ineficaz o ato jurídico cujo implemento subordina-se a condição juridicamente impossível, considerada como tal aquela proibida em lei (artigo 116). Consoante o ensinamento de Clóvis Bevilácqua, “o direito não pode amparar o que lhe é adverso”, decorrendo daí o fundamento dessa ineficácia. O exemplo clássico dessa hipótese é si homicidium feceris ou si homicidium no feceris.

 

No caso em tela, o empregador estipulou meta elevada de anúncios, os quais deveriam ser captados para publicação em jornal de baixa circulação (Diário da Tarde). A prova oral não deixa dúvida quanto à inviabilidade de cumprimento da meta, pois nenhum empregado chegou a alcançá-la em tempo algum, consoante informação da própria preposta. Ainda que a condição estabeleça obrigação de difícil implemento, não se enquadra em nenhuma das previsões referidas acima, pois além de se tratar de ajuste não proibido em lei, nele não se vislumbra contradição ou impossibilidade física.

 

Não vejo, outrossim, afronta ao princípio da proteção. A imposição da meta de vendas foi adotada pelo empregador dentro do poder diretivo que lhe confere o artigo 2º da CLT. Tampouco restou evidenciada a redução salarial. Veja-se que a autora percebia parcela fixa, acrescida das comissões. O cálculo dessas últimas, conforme já acentuado acima, correspondia a 1,8% do valor dos anúncios, deduzidos 20% do total apurado em favor da obreira. Essa dedução devia-se ao fato de não ter sido atingida a meta prevista para o Diário da Tarde. Nota-se que o empregador instituiu duas formas de remunerar a produtividade nesse caso. Uma parcela das comissões remunerava pura e simplesmente a venda dos anúncios; a outra parcela – os 20% deduzidos – constituía, na verdade, prêmio pela meta atingida. Se a autora nunca atingiu a previsão de vendas para um dos jornais, não pode reivindicar essa parcela das comissões.

 

Por todas essas razões, considero indevida a restituição postulada.

 

Indenização adicional

 

A autora foi dispensada em 5.3.2002, após cumprir o aviso prévio recebido no dia 4.2.2002 (fl. 13). A data-base da categoria é 1º de abril, como se infere de fl. 45. Resta claro, portanto, o desligamento ocorrido no trintídio que antecedeu à data-base. Logo, é devida a indenização adicional, faltando com a verdade o reclamado quando diz que o pe-

ríodo do aviso prévio teria remetido a cessação do contrato de trabalho para época posterior à data-base.

 

Nada a prover.

 

Diante do exposto, dou provimento parcial ao recurso do reclamado para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho; provejo, ainda, o apelo, para excluir da condenação a restituição das comissões e os reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido sobre o aviso prévio trabalhado.

 

O valor atribuído à condenação fica mantido.

 

Fundamentos pelos quais, acordam os juízes do Tribunal Regional do Trabalho da

3ª Região, pela sua Segunda Turma, unanimemente, em conhecer do recurso; sem divergência, em dar-lhe provimento parcial para determinar a apuração das horas extras decorrentes da ausência do descanso previsto no artigo 72 da CLT, equivalente a dez minutos para cada noventa de trabalho, bem como excluir da condenação a restituição das comissões e os reflexos das horas extras correspondentes ao intervalo suprimido sobre o aviso prévio trabalhado, mantido o valor atribuído à condenação.

 

Belo Horizonte, 6 de agosto de 2002.

 

Alice Monteiro de Barros

Presidente ad hoc e Relatora

 

Os RO nºs 3.317/2002 (julgado em 30.4.2002, publicado em 8.5.2002); 8.102/2002 (julgado em 6.8.2002, publicado em 14.8.2002) e 8.298/2002 (julgado em 13.8.2002, publicado em 22.8.2002).

 

RDT nº 1 – janeiro de 2003

 

Advocacia Trabalhista Curitiba – Zavadniak & Honorato Advogados Trabalhistas Curitiba
Advocacia Especializada – Robson Zavadniak advogado
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